“Foram 9 anos a escrever as emoções e as reflexões mais fortes, sobre as minhas missões humanitárias de um mundo que é o nosso.”
Em Junho de 2014 aconteceu o que ninguém imaginaria ser possível, o Estado Islâmico (ISIS ou Daesh) invadiu e tomou posse da segunda maior cidade do Iraque, Mosul. Pela primeira vez um grupo alimentado pelo terror controlou uma cidade tão importante, com 2 milhões de pessoas que sofreram o inimaginável pela repressão, castração e total ausência de liberdades físicas e intelectuais. “Pior que a morte” muitos diziam.
Sendo eu ateu ou agnóstico (como preferirem), mas com uma educação católica, o respeito e a tolerância por todas as diferentes formas de estar na vida, têm sido em mim uma busca constante. O rótulo que cada um leva pela religião que professa diz-me pouco. A única coisa que verdadeiramente valorizo são as qualidades humanas. Sempre me questionei quem seria eu se tivesse nascido do “outro lado” do mundo? Quem seria se tivesse nascido na China? Ou na Somália? Ou na Rússia? Ou no Afeganistão? Ou na Índia? Ou na Coreia do Norte? Quem seria eu se tivesse passado fome? Ou se tivesse perdido a minha mãe no parto do meu irmão, por falta de cuidados médicos?
Mesmo antes de partir em missão, o livro foi apresentado ao mundo. Foram centenas de pessoas que fizeram este livro acontecer, entre os que escreveram as cartas, os que as traduziram e por ai fora. O auditório transbordava de gente, mas acima de tudo de boas energias, de empatia, de compaixão de vontade mostrar que nada é mais importante do que a nossa humanidade partilhada.
Eu achei que estava preparado, mas não estava. Nunca estive e espero nunca estar. Ninguém devia estar preparado para isto…
Espero que a história nunca se esqueça de contar em letras bem gordas, aquilo que os nossos irmãos do Iraque estão a passar. Para que não nos esqueçamos, para que aprendamos a lição, porque no fundo, no fundo é culpa de todos nós!
Ao contrário do que tantas vezes pensamos não são só as bombas e os tiros que matam. Em todas as guerras, o que mais mata é a distância de quem vê e nada sente, de quem sabe e nada diz, de quem podia e nada fez. A distância – que se torna ausência – mata dolorosamente, numa dor moída e prolongada. Os que vivem sob o manto tenebroso dos conflitos, em pântanos de medo e de dor, sofrem muito mais por se sentirem sozinhos e distantes do mundo.
O que o Gustavo está a fazer com este livro, escrito por tantos, tem tudo de ‘quase nada’! Posso testemunhar a esperança que gera saber que há outros, bem lá longe, que sabem o que ‘estamos a padecer e nos acompanham’! É impressionante ver o que o interesse sincero e preocupado de desconhecidos longínquos gera em fraternidade e proximidade no coração daqueles que se experimentam sós e esquecidos, encurralados.
O Dr. Gustavo merece todo o meu respeito, amizade, estima e consideração porque sei bem a renuncia que implica aceitar ir ao encontro do seu irmão em sofrimento em qualquer parte do mundo, assumindo todos os riscos e pondo o seu saber e a sua sensibilidade humana ao serviço dos outros.
Depois de 3 anos da horrenda ocupação pelo Estado Islâmico, Mosul foi vítima de uma batalha sangrenta. Cerca de 2 milhões de pessoas foram usadas como escudos humanos à mercê das bombas, snipers, fome e várias doenças, no maior sequestro colectivo que há memória. Mas de Portugal, um movimento da sociedade civil, encabeçado pelo médico Gustavo Carona, organizou-se para o envio de centenas de cartas na forma do livro “1001 Cartas para Mosul”, que abriram um canal de comunicação que parecia impossível.
Este é o livro das respostas. Novamente através de cartas, são agora os iraquianos, que sofreram o inimaginável, que nos contam o que lhes vai no coração.
1001 Cartas para Mosul