Afeganistao

Há milénios habitada, esta terra era um dos grandes cruzamentos das rotas da seda. Fez parte da história de grandes impérios: Alexandre o Grande, os Árabes Muçulmanos, os Mongóis, e os Impérios Russo e Britânico. Mas sempre foi, tal como o seu nome indica a terra dos Afegãos, e por isso ganhou as alcunhas do “Inconquistável” ou de “o cemitério dos impérios” porque vários o tentaram controlar e nunca conseguiram, como a história recente o comprova.

No séc. XIX torna-se um “estado tampão” entre os gigantes impérios Russo e Britânico, neste confronto épico a que se chamava o “Great Game”. Várias foram as tentativas dos ingleses de tomar Kabul, mas sofreram invariavelmente duras humilhações militares, o que os fez criar a “linha de Durant” que dividia o Afeganistão da Índia Britânica. Mas perigosamente esta linha divide também os Pashtun que são o povo dominante do Afeganistão e daí a relação tão íntima entre um grande pedaço do actual Paquistão, por serem o mesmo povo com o mesmo idioma.

Assim se explica também a curiosa língua de terreno que se vê desenhada no mapa do Afeganistão em direcção à China servindo o propósito de não deixar tocar o gigante Russo e o gigante Britânico.

Durante a monarquia do Rei Shah (1933-73) o Afeganistão era um país aberto ao mundo e um destino muito procurado por todos os viajantes pela sua história, cultura e beleza natural.

Golpes de estado atrás de golpes de estado, levaram os russos a entrar na política do Afeganistão para que se mantivesse à esquerda, e com isto a ocupação soviética e a guerra que tanta coisa mudou (1979).

Os Afegãos são o típico povo que não se governa e não se deixa governar, e por isso montaram uma resistência de guerrilha por parte de diferentes grupos de Mujahideen (guerrilheiros do Islão) que por todo o país se opuseram ferozmente ao domínio militar russo.

Vários estados árabes patrocinaram esta resistência por não admitirem perder território muçulmano para “infiéis” e os americanos aproveitaram para alimentar mais uma frente da sua Guerra Fria. É nesta altura que o saudita/iemenita Osama Bin Laden entra no Afeganistão como um de muitos que faziam a ponte entre o dinheiro árabe e a Jihad no terreno.

Quando em 1992 os russos compreendem que nunca conseguirão dominar este país regressam a casa, e de imediato 7 grupos de Mujahideen se viram uns contra os outros num dos períodos mais sangrentos e destrutivos da história do Afeganistão, que só termina quando os Taliban ganham controlo do território, em 1996. Este grupo de fundamentalistas islâmicos chega ao poder por pregar um discurso radical que une as fragilidades deste povo, a religião. Apesar das conhecidas atrocidades, execuções, apedrejamentos, crimes contra a humanidade e retrocesso civilizacional chocante é um período de franca estabilidade e paz relativa no país, que só é interrompida pela invasão dos americanos e aliados, em 2001.

Os Taliban decidiram não entregar Osaba Bin Laden, e então todo o mundo invadiu o Afeganistão numa guerra que dura até aos dias de hoje, onde os portugueses, à sua escala, também estiveram envolvidos. Já matou mais de 500.000 pessoas e veio agravar a pobreza extrema daquele que é um dos povos mais pobres e mais sofredores do mundo.

Eu lembro-me como se fosse hoje…

Um dia que só não marcou a vida dos mais desatentos…

Tinha 20 anos, estava numa casa temporária, pois o apartamento dos meus pais estava em obras. Estava numa fase fantástica da minha vida, como sempre fui um rapaz muito lutador e cumpridor, tinha feito todos os exames direitinho do 3º ano da Faculdade de Medicina, sem nunca deixar nada para a época de Setembro, desfrutava dumas férias fantásticas, de muita festa, muito surf, muito desporto e poucas chatices ou responsabilidades…

(…)

Aterrar em Kabul, é no mínimo lindo de morrer. Após sobrevoar uma enorme parte do Afeganistão, a contemplar a incrível beleza da cordilheira do Hindu Kush, com montanhas lindas cheias de neve, enquanto tentava imaginar àquela enorme distancia o terrível sofrimento que aquele pais tem estado sujeito… Uma guerra é algo horrível….. a sensação de, a existência desta guerra estar assumida nas nossas mentes, por um processo de habituação, após 11 anos de guerra bem dura (agora a caminho dos 14 anos), ultrapassa tudo! Estar em guerra não pode ser normal!!

(…)

A primeira mensagem que eu gostava de deixar é que uma guerra, não passa apenas porque deixamos de ouvir falar nela… simplesmente deixa de ser interessante para os media e seus consumidores, ouvir/ler/ver mais do mesmo…

A guerra do Afeganistão não pára de piorar, a cada ano há mais ataques, há mais vítimas, mais dor e sofrimento…

(…)

Continuo no Sul do Afeganistão… ponto mágico deste planeta…com a sensação que estou longe….muito longe de todo o mundo, principalmente do meu mundo… Gosto de o sentir, mas é impossível não ser invadido por um certo calafrio quando paramos para reflectir do quão longe e isolados estamos do mundo… Rodeado de guerra a toda a volta a única forma de sair da cidade de LashKar Gah, é num pequeno avião da Cruz Vermelha, que ali passa 2xs por semana… Se algo acontecer…o destino passa a ser muito incerto…

Aqui vos conto uma história de um dos dias mais marcantes de toda a minha vida…

(…)

Há qualquer coisa de mágica sobre o Afeganistão… Todos os países têm o BI do seu povo e da sua terra e o do Afeganistão é bem forte… Localizado numa fronteira entre mundos, sempre foi a terra dos Afegãos… Gente de carácter vincado, sólido e inspirador… Triste é que aos olhos de quase todo o mundo se trata apenas de uma campo de batalha… quando é tão mais do que isso…

(…)

De volta ao Afeganistão…..fecho os olhos e regresso ao Afeganistão…ou talvez um bocado antes….à Partida, à preparação, literalmente para a Guerra.

Neste momento tenho imensa vontade de escrever, fico na dúvida se tenho vontade de ser lido (que é sempre um ânimo), ou se simplesmente preciso de escrever e reviver vivências que são tão importantes para mim…

(…)

Em Kabul, tenho muito pouco tempo para me preparar para ir para o meu destino final: província de Helmand, no sul do Afeganistão, cidade: Lashkar Gah, capital da província mais sangrenta e problemática de toda a guerra do Afeganistão. No cerne da resistência Taliban, e rodeada da maior produção de ópio do pais e do planeta…. região paupérrima, com carências a nível de cuidados de saúde ao nível do pior que o nosso mundo conhece.

(…)

(presente de anos para a minha querida mãe nos seus 65 anos)

Foram 10 minutos que mudaram a minha vida… Entre o amor e ódio, entre o desistir ou lutar com mais força… uma lição de vida…. uma inspiração sustentada em tristes e felizes circunstâncias do acaso… porque a vida é mesmo assim, cabe-nos a nós aprender a (melhor possível) lição…

(…)

Nesta história que me marcou de sobre maneira, simbolizo também o reforçar de uma das primeiras conclusões humanitárias se assim lhe posso chamar… A intensidade de viver não só o problema, mas viver no problema, para alem do meu trabalho clínico e de formação, leva-me obviamente a uma reflexão diária dos “porquês”, destas catástrofes humanitárias que tenho vivido de bem perto…

(…)

Fechando a página sobre o Afeganistão. Às vezes tenho que me perguntar e puxar bem atrás as minhas memórias para que me recorde porque é que eu comecei a escrever… E talvez misturando e baralhando uma série de sensações eu diria que o ponto em comum em todo a minha escrita e que acho que me vou mantendo fiel e honesto é tentar fazer com que possamos ver que todas as vidas deveriam ter o mesmo valor…

(…)

Eu lembro-me como se fosse hoje…

Um dia que só não marcou a vida dos mais desatentos…

Tinha 20 anos, estava numa casa temporária, pois o apartamento dos meus pais estava em obras. Estava numa fase fantástica da minha vida, como sempre fui um rapaz muito lutador e cumpridor, tinha feito todos os exames direitinho do 3º ano da Faculdade de Medicina, sem nunca deixar nada para a época de Setembro, desfrutava dumas férias fantásticas, de muita festa, muito surf, muito desporto e poucas chatices ou responsabilidades…

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De volta ao Afeganistão…..fecho os olhos e regresso ao Afeganistão…ou talvez um bocado antes….à Partida, à preparação, literalmente para a Guerra.

Neste momento tenho imensa vontade de escrever, fico na dúvida se tenho vontade de ser lido (que é sempre um ânimo), ou se simplesmente preciso de escrever e reviver vivências que são tão importantes para mim…

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Aterrar em Kabul, é no mínimo lindo de morrer. Após sobrevoar uma enorme parte do Afeganistão, a contemplar a incrível beleza da cordilheira do Hindu Kush, com montanhas lindas cheias de neve, enquanto tentava imaginar àquela enorme distancia o terrível sofrimento que aquele pais tem estado sujeito… Uma guerra é algo horrível….. a sensação de, a existência desta guerra estar assumida nas nossas mentes, por um processo de habituação, após 11 anos de guerra bem dura (agora a caminho dos 14 anos), ultrapassa tudo! Estar em guerra não pode ser normal!!

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Em Kabul, tenho muito pouco tempo para me preparar para ir para o meu destino final: província de Helmand, no sul do Afeganistão, cidade: Lashkar Gah, capital da província mais sangrenta e problemática de toda a guerra do Afeganistão. No cerne da resistência Taliban, e rodeada da maior produção de ópio do pais e do planeta…. região paupérrima, com carências a nível de cuidados de saúde ao nível do pior que o nosso mundo conhece.

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A primeira mensagem que eu gostava de deixar é que uma guerra, não passa apenas porque deixamos de ouvir falar nela… simplesmente deixa de ser interessante para os media e seus consumidores, ouvir/ler/ver mais do mesmo…

A guerra do Afeganistão não pára de piorar, a cada ano há mais ataques, há mais vítimas, mais dor e sofrimento…

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(presente de anos para a minha querida mãe nos seus 65 anos)

Foram 10 minutos que mudaram a minha vida… Entre o amor e ódio, entre o desistir ou lutar com mais força… uma lição de vida…. uma inspiração sustentada em tristes e felizes circunstâncias do acaso… porque a vida é mesmo assim, cabe-nos a nós aprender a (melhor possível) lição…

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Continuo no Sul do Afeganistão… ponto mágico deste planeta…com a sensação que estou longe….muito longe de todo o mundo, principalmente do meu mundo… Gosto de o sentir, mas é impossível não ser invadido por um certo calafrio quando paramos para reflectir do quão longe e isolados estamos do mundo… Rodeado de guerra a toda a volta a única forma de sair da cidade de LashKar Gah, é num pequeno avião da Cruz Vermelha, que ali passa 2xs por semana… Se algo acontecer…o destino passa a ser muito incerto…

Aqui vos conto uma história de um dos dias mais marcantes de toda a minha vida…

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Nesta história que me marcou de sobre maneira, simbolizo também o reforçar de uma das primeiras conclusões humanitárias se assim lhe posso chamar… A intensidade de viver não só o problema, mas viver no problema, para alem do meu trabalho clínico e de formação, leva-me obviamente a uma reflexão diária dos “porquês”, destas catástrofes humanitárias que tenho vivido de bem perto…

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Há qualquer coisa de mágica sobre o Afeganistão… Todos os países têm o BI do seu povo e da sua terra e o do Afeganistão é bem forte… Localizado numa fronteira entre mundos, sempre foi a terra dos Afegãos… Gente de carácter vincado, sólido e inspirador… Triste é que aos olhos de quase todo o mundo se trata apenas de uma campo de batalha… quando é tão mais do que isso…

(…)

Fechando a página sobre o Afeganistão. Às vezes tenho que me perguntar e puxar bem atrás as minhas memórias para que me recorde porque é que eu comecei a escrever… E talvez misturando e baralhando uma série de sensações eu diria que o ponto em comum em todo a minha escrita e que acho que me vou mantendo fiel e honesto é tentar fazer com que possamos ver que todas as vidas deveriam ter o mesmo valor…

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