Mamoudou Gassama, teve o impulso de galgar quatro andares para salvar uma vida.
Nós tantas vezes, tão pouco o de estender a mão para fazer o mesmo.
Mamoudou Gassama. O nome pouco nos dirá. As imagens deste homem a galgar quatro andares para salvar uma criança da morte certa, essas sim, já nos dirão alguma coisa. Até há uma semana atrás, Mamoudou Gassama, era um cidadão anónimo. Mais um. Desses que enchem as ruas das cidades europeias. Desses que fazem travessias inenarráveis. Físicas e psicológicas.
Mamoudou Gassama, foi mais um que chegou. Sabemos vagamente de onde, mas o que nos interessa no momento em que olhamos as imagens é o resgate do perigo eminente. É também a força pulsante de quem sobe, alheio ao perigo, olhos postos na salvação.
É-nos estranho, mas talvez tão natural para quem já teve um dia de fixar um único ponto para salvar a própria vida.
Veio do Mali.
Antiga colónia francesa. Uma história semelhante à de tantos outros países africanos. Guerras, golpes de estado, corrupção, fome, miséria. A debandada de quem tem para onde ir e de quem não tendo, ali não pode ficar.
A comunidade internacional de olhos semicerrados.
Nós, que apenas os abrimos para ver um homem a trepar um prédio acima e depois os haveremos de fechar novamente.
E a maior parte de nós não faz ideia do que se passa no Mali. Como não fazíamos ideia de quem era Mamoudou Gassama. Como não fazemos ideia de quem são tantos outros que, como ele, deambulam entre nós, capazes de subir até às nuvens, perante o olhar de tantos, incapazes de levantar os pés do chão.
Não nos podemos culpar excessivamente por esse obscurantismo. Não partimos em busca da desgraça e deglutimos as desgraças que as televisões nos colocam à frente à hora de almoço e de jantar.
Se passássemos por Mamoudou Gassama numa rua qualquer, de uma qualquer capital europeia, os olhos desviar-se-iam. Quantos olhos não se desviaram, até que, por puro acaso e imensa coragem, o corpo pulsante daquele homem se elevou prédio acima? E então todos os ergueram ao céu.
Que a estória de Mamoudou Gassama, nos dê a humildade de mais vezes os levantarmos do chão. Há muitas vidas que precisam de ser salvas. Nem sempre suspensas em prédios. Às vezes, basta-nos estender a mão.
Simone Oliveira
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